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Mar 28, 2025

A CIVILIDADE É O BÁSICO

Por Tamara Rodrigues


Muitos cientistas têm se dedicado a investigar o funcionamento do cérebro humano e a influência do meio sobre os processos mentais humanos. A compreensão desses mecanismos é essencial para desvendar a complexa relação entre natureza e cultura, genética e ambiente, instinto e razão.


Muito se pode encontrar na literatura científica moderna a respeito desse tema. Pesquisadores como Sigmund Freud, por exemplo, ao propor sua teoria psicanalítica, argumentou que grande parte do comportamento humano é impulsionada por desejos inconscientes que emergem da interação entre o id, o ego e o superego. Já Ivan Pavlov, com seus famosos experimentos sobre condicionamento clássico, demonstrou como estímulos ambientais podem moldar respostas comportamentais automáticas, como visto no famoso experimento com cães.


Críticos de Freud afirmam que sua teoria é pseudocientífica, o que é uma meia-verdade. Para uma análise mais aprofundada desse tema, veja o “Guia dos apodícticos”, nos capítulos que tratam de método científico e temas afins.


Mais recentemente, a neurociência avançou consideravelmente no entendimento de como as estruturas cerebrais influenciam o comportamento humano. Estudos com neuroimagem funcional têm revelado áreas específicas do cérebro associadas a processos como tomada de decisão, empatia e cognição moral. Há uma vasta quantidade de estudos publicados que exploram esses fenômenos com profundidade.


Minha motivação para escrever este texto surge do início do livro “Como a Mente Funciona” de Steven Pinker, que tem me feito refletir profundamente sobre a interação entre o biológico e o cultural na formação do comportamento humano.


A História e o Sucesso dos Padrões Dogmáticos Comportamentais


Ao longo da história, sociedades que estabeleceram padrões dogmáticos de comportamento e sistemas estruturados de regras morais e sociais alcançaram maior sucesso em termos de organização e progresso. O papel da civilidade, da religião e das etiquetas sociais, embora por vezes criticado, foi determinante para a construção de sociedades mais estáveis e harmoniosas. Esses elementos agem como freios necessários à natureza instintiva e predatória da mente humana, que, sem tais controles, poderia resultar em caos e destruição.

Um exemplo clássico é o impacto das religiões edificadas a partir da formação de códigos morais que orientaram sociedades inteiras durante séculos. O cristianismo medieval, por exemplo, foi essencial para a consolidação da Europa como uma civilização coesa, com normas éticas que impediam a barbárie desenfreada. Da mesma forma, o confucionismo exerceu uma profunda influência na estrutura social chinesa, com suas regras claras de hierarquia, respeito e comportamento adequado.


Durante o período Edo no Japão (1603-1868), o código Bushidō, desenvolvido pelos samurais, tornou-se um exemplo notável de sistema ético que transcendia a mera prática militar e influenciava todos os aspectos da vida social e cultural. Este código enfatizava virtudes como honra, lealdade, disciplina e respeito, contribuindo para a formação de uma sociedade próspera e ascendente.


A civilidade e os códigos de conduta funcionam como uma espécie de “contrato social implícito” que permite a coexistência harmoniosa entre indivíduos – mesmo quando há fortes divergências de opiniões e interesses –, impondo limites aos comportamentos considerados nefastos individualmente e coletivamente.


Manipulação, Escolhas e Comportamento de Manada


A maior parte das pessoas é facilmente manipulável e nem sempre sabe o que de fato quer, nem quais são as melhores escolhas para si mesmas. Para ilustrar, imagine que se ofereça a uma criança um conjunto de alternativas onde todas são desfavoráveis, mas que apresentam diferenças aparentes de valor. A criança, sem critérios adequados, escolherá entre essas opções, mesmo que todas sejam ruins. Poucas crianças, talvez menos de 1%, serão capazes de julgar a situação com profundidade suficiente para renunciar a todas as alternativas oferecidas e criar alternativas mais promissoras.


No comportamento adulto, isso se reflete na sociedade como um todo: seres humanos frequentemente tomam decisões irracionais, movidos por instintos primitivos e influências inconscientes. Esse tipo de manipulação se torna ainda mais evidente quando se analisa o fenômeno do comportamento de manada.


O comportamento de manada é um fenômeno profundamente enraizado na psicologia humana. Esse fenômeno é analisado em muitos livros como “O andar do bêbado”, “Rápido e devagar” e outros que seguem essa mesma linha, livros que fizeram grande sucesso desde 2007, mas foram gradualmente se tornando cópias uns dos outros, com pouco acréscimo inovador. Uma notável exceção é o “Guia dos apodícticos”, que segue uma linha muito semelhante, mas numa perspectiva inovadora, e mantendo um padrão de excelência igual ou superior às obras primas do gênero.


Na apresentação do “Guia dos Apodícticos”, destaco um fragmento particularmente relevante para nossa análise: “uma pergunta respondida por 100 especialistas diferentes terá praticamente a mesma resposta repetida 100 vezes, com pequenas alterações, como se tivessem sido copiadas ou aprendidas de uma fonte comum a todos eles.”


Estudos sobre teoria do caos, como os realizados por Edward Lorenz e Mitchell Feigenbaum, demonstram que sistemas dinâmicos não-lineares, incluindo comportamentos sociais, podem ser imprevisíveis e sensíveis a pequenas alterações nas condições iniciais. Isso se aplica ao comportamento coletivo, onde ideias mal fundamentadas podem se propagar e gerar resultados caóticos em sociedades inteiras.

 

O Perigo da Liberdade de Expressão e o Papel dos Dogmas


A liberdade de expressão, embora essencial para o desenvolvimento do pensamento crítico e científico, também pode ser perigosa quando usada sem suficiente responsabilidade. A existência de dogmas de comportamento e de etiquetas sociais é fundamental para garantir que as interações humanas sejam minimamente civilizadas e produtivas. Pessoas que falam sem pensar, sem medir as consequências de suas palavras, frequentemente criam conflitos e rupturas sociais desnecessárias.


O conceito de liberdade absoluta é ilusório e potencialmente destrutivo. O grande filósofo Platão já discutia a diferença entre “liberdade” e “licenciosidade”. Pensadores como John Stuart Mill discutiram a necessidade de limitar a liberdade individual quando ela ameaça o bem-estar da sociedade. Grandes gênios como Isaac Newton, Albert Einstein e Hindemburg Melão Jr. compreenderam que o rigor metodológico e o estabelecimento de princípios bem definidos são fundamentais para o avanço do conhecimento humano.


A análise apodíctica, conforme apresentada no “GUIA DOS APODÍCTICOS” se destaca como uma ferramenta valiosa para discernir entre o comportamento coletivo apropriado e os desvios irracionais que frequentemente ocorrem na sociedade. Ao aplicá-la, é possível identificar quando a manada segue por um caminho promissor e quando ela se desvia para a irracionalidade. Isso é importante porque nem sempre a manada está errada, de modo que sempre evitar seguir a manada não seria a melhor solução. O melhor é analisar com bons critérios, compreender, julgar e então decidir se é melhor seguir a manada. Caso não seja, qual dos numerosos outros caminhos é o mais recomendável.


Este artigo é um convite à reflexão sobre como podemos aperfeiçoar nosso entendimento sobre a mente humana e os mecanismos que regulam seu comportamento. É também um alerta sobre os riscos do comportamento irrefletido e das ilusões coletivas que frequentemente se perpetuam por meio da imitação. A maioria das pessoas não percebe o quanto agem por imitação mais de 90% do tempo, tanto em suas ações quanto em suas palavras, perdendo sua individualidade para se tornarem fantoches nas mãos dos que manipulam as massas. Ninguém reconhece a si mesmo como parte das massas de manobra, mas a verdade é que todos nós somos, em alguma medida, inclusive o Hindemburg, inclusive Einstein, inclusive Newton. A diferença está apenas em que medida somos capazes de perceber os truques usados para nos manipular e nossa habilidade para reagir, revertendo essas tentativas em nosso favor.  


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