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May 20, 2025

Qual o peso da sua influência?

Por Tamara Rodrigues


O desabamento de um edifício é uma cena trágica e traumática, que pode prejudicar dezenas ou até centenas de pessoas, mas há outros processos de ruína de dimensões muito maiores, que prejudicam milhões de pessoas, mas não fazem barulho. Não se vê em manchetes, não causa colapso em bolsas de valores nem provoca quedas de governos. É uma erosão lenta, persistente, que corrói os fundamentos morais de uma sociedade até que reste apenas o verniz do que um dia foi decente. É sobre essa ruína silenciosa — e sobre o papel que cada um de nós desempenha nela — que preciso falar.


Desde criança, ouvi frases da minha mãe que ecoam até hoje:

“Você tem que estudar para ser alguém na vida.”

“Você não vai querer ser como eu quando crescer.”


Essa segunda frase doía mais nela do que em mim. Minha mãe veio da pobreza extrema. Abandonou os estudos ainda criança. Foi cozinheira, faxineira, babá — trabalhos que ela nunca desvalorizou, mas que a sociedade sempre enxergou com desdém. Para ela, educação era a chave que abriria portas que a vida mantivera trancadas.


Naquela época, não havia redes sociais. Mas minha mãe também teve seus "influencers": pessoas da vizinhança que tinham estudado, que falavam bem, que tratavam os outros com educação. Ela admirava essas pessoas. Apontava os bons exemplos, dizia: "olha como ela se comporta, estuda, trabalha direito". Foi assim que ela aprendeu que comportamento e estudo abrem caminhos. E foi isso que tentou me ensinar.


Hoje, com mais maturidade, percebo: se metade da população tivesse os valores éticos da minha mãe, o Brasil seria um país melhor. O problema nunca foi o trabalho dela — foi o desprezo por valores que, quando ausentes, destroem qualquer nação. Até mesmo em civilizações desenvolvidas como o Império Romano e as dinastias egípcias, com históricos milenares de sucesso, a corrupção moral os arruinou. Em contrapartida, civilizações que adotam uma postura honrada e valorizam a ética, a honestidade, a nobreza de caráter e os valores morais elevados, são capazes de se reconstruir das maiores desgraças em pouco tempo, como foi o caso do Japão após a segunda guerra mundial.


Minha mãe nos ensinou a estudar. Mas mais do que isso: ensinou que caráter é currículo. Que não são os diplomas que fazem o mundo melhorar, mas sim a decência das pessoas. Ensinou que a educação verdadeira começa no modo como tratamos as pessoas e animais, independentemente de não poderem nos oferecer algo em troca.


Nunca fui muito fã de redes sociais, mas quando comecei a treinar na academia para melhorar minha autoestima com meu corpo, criei uma conta fechada no Instagram. Ali, compartilhei minha evolução: a Tamara sedentária, com baixa autoestima, começava a mudar. Naquele início, achei que eu estava inspirando as pessoas do meu círculo.


Mas, com o tempo, algo começou a me incomodar profundamente. Os meus treinos passaram a ser acompanhados de suplementos cujos preços não são acessíveis a todos, minha alimentação balanceada por orientação de nutricionista, meu tempo livre para dormir bem, isso não era acessível à grande maioria. Cada foto da minha barriga definida não mostrava só esforço — mostrava também privilégio. E quando alguém que luta para pagar o arroz me via postando pasta de amendoim com whey, será que se sentia inspirado? Ou humilhado?


Parei de postar.


Entendi que até o silêncio é uma escolha ética e que nem tudo que é bonito deve ser mostrado, porque parte do que mostramos pode ferir, mesmo sem intenção. Comecei a pensar “qual o bem social que estarei causando se postar isso?”


A verdade é que somos responsáveis pelo que cativamos, como disse o Pequeno Príncipe. Isso deveria estar nas diretrizes do Instagram ou de qualquer rede social. Porque, sim, temos responsabilidade sobre o impacto do que mostramos. Hoje vivemos mergulhados em um mar de influenciadores que não têm compromisso com a verdade — nem com a moral. Gente que ostenta mentiras, promove vícios, banaliza o sexo, ridiculariza o saber, e lucra em cima da dor e da ilusão de quem assiste. Mas há algo mais grave: fazem isso impunemente e são glorificados, vistos como heróis. É como se aquilo que eles compartilham não tivesse consequência, como se influência fosse um brinquedo. Mas influência é um poder que deveria ser exercido com extrema responsabilidade e só deveria ocupar a posição de influencer quem realmente tem méritos e capacidade para isso. Durante milênios, os membros do Alto Clero foram os influencers na maior parte do Ocidente, e promoviam pensamentos elevados sobre conduta moral, reflexão sobre o que é certo, eram bons influencers. Claro, nem todos, mas eram exceções. Agora a imoralidade é a regra.


Educar nossas crianças e jovens em meio a essa avalanche de degradação é tarefa quase impossível. Como dizer a uma criança que o respeito é importante se os rostos mais populares da internet ganham dinheiro sendo grosseiros, maldosos, desonestos, enriquecem às custas da disseminação do ódio, da perversão, de mentiras, de ofensas gratuitas em busca de likes? Como falar de mérito, se a fama vem de expor o corpo e não de expandir a mente?


Jesus foi o maior influenciador da história — e não precisou de redes sociais para transformar bilhões de vidas ao longo dos séculos.


Precisamos, com urgência, resgatar o valor da influência que edifica. Ser exemplo não é sobre perfeição. É sobre direção. E num mundo onde a bússola moral parece quebrada, quem aponta o norte — mesmo que em silêncio — já está fazendo muito.


A influência, no fundo, é uma responsabilidade compartilhada. Mesmo que você tenha poucos seguidores, mesmo que não poste quase nada. O que você aplaude, o que você compartilha, o que você normaliza — tudo isso molda o mundo em que vivemos.


Quer mudar o Brasil? Comece filtrando o que você espalha.


Seja a voz que compartilha virtudes.


Seja a imagem que aponta para o essencial.


Vivemos repetindo que queremos um país melhor. Mas continuamos aplaudindo o que destrói, compartilhando o que adoece, seguindo quem nos afasta da virtude. Mudança real não começa nas urnas, nem nas ruas — começa nas escolhas invisíveis que fazemos todos os dias: o que elogiamos, o que tornamos popular, o que aceitamos como “normal”.


Se cada um de nós assumisse a responsabilidade de ser um exemplo — mesmo pequeno, mesmo imperfeito — já estaríamos salvando o futuro.


Porque não são os grandes discursos que moldam uma nação, mas os gestos cotidianos de quem decide, em silêncio, ser parte da solução.



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